Apresentação
Resumen
É com grande satisfação que apresentamos à comunidade acadêmica e científica a Revista da ANINTER-SH, periódico da ASSOCIAÇÃO NACIONAL EM PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO INTERDISCIPLINAR – SOCIAIS E HUMANIDADES (ANINTER-SH), já no 13° ano de existência, e cujo número inaugural encontra-se à disposição de todas as pessoas associadas e leitores em geral.
A revista é resultado do esforço de vários dos membros da atual Diretoria da ANINTER-SH, autores vinculados aos programas de pós-graduação que a ela são associados, participantes do Fórum dos Programas de Pós-Graduação da Área Interdisciplinar da CAPES e outros autores que desenvolvem pesquisas interdisciplinares no Brasil.
Sempre foi preocupação da ANINTER-SH ter um veículo de divulgação da produção acadêmica voltada para as questões relacionadas com a interdisciplinaridade, tanto teoricamente quanto na sua dimensão empírica, envolvendo projetos de pesquisa, teses e dissertações, e artigos que discutam essa temática, que se relaciona diretamente com a realidade acadêmica do conjunto de programas de pós-graduação que fazem da Área Interdisciplinar a maior e mais diversificada da CAPES.
Apesar dessa importância da Área na CAPES, a questão da interdisciplinaridade envolve discussões que ultrapassam o limite estritamente científico e acadêmico, já de por si denso e multifacetado, para avançar sobre questões relacionadas à prática e às oportunidades profissionais daqueles que buscam diversificar sua formação profissional, mas que encontram barreiras associadas a uma perspectiva focada em uma leitura disciplinar da vida acadêmica e científica no momento de procurar chances de garantir sua inserção no mercado de trabalho e, com isso, sua sobrevivência econômico-financeira.
Essa não é uma questão menor, permitam-nos destacar. A Área Interdisciplinar surge a partir de estímulo institucional da própria CAPES na década de 1990, como resultado de uma crescente insatisfação com as análises destacadamente disciplinares da realidade, em especial da dinâmica social, que se tornou comum na produção científica e acadêmica no último quarto do século XX, em várias partes do mundo, e que encontraram em autores tão diversos como Jean Piaget e Edgar Morin, na Europa, e Ivani Fazenda, Olga Pombo, Hilton Japiassu, Galdêncio Frogotto e Paulo Freire no Brasil, para citar somente alguns, referências importantes para a discussão sobre a interdisciplinaridade e sua potencial contribuição para uma abordagem da realidade social mais próxima da sua complexidade estrutural.
Esta leitura e sua crescente aceitação mundo afora, representou, do ponto de vista institucional, uma oportunidade para que programas de pós-graduação de todo o país fossem estimulados e criados na perspectiva interdisciplinar.
De acordo com os dados abertos da Capes (Dados Abertos (capes.gov.br) cuja atualização consta como de 2021, naquela ano, havia 4.691 programas, sendo 4.563 com cursos em funcionamento e 128 cursos em desativação. Já a área Interdisciplinar da Capes (área 45) tinha em sua base no ano de 2021, 385 Programas com cursos de Mestrado, ou Mestrado e Doutorado, com 20 em desativação. Desses 385 Programas, oito não se enquadravam em suas quatro câmaras, 97 estavam lotados na câmara de Engenharia, Tecnologias e Gestão (sendo oito cursos em desativação), 49 Programas na câmara de Meio Ambiente e Agrárias, 85 na câmara de Saúde e Biológicas e 146 na câmara de Sociais e Humanas – sendo que nas últimas três câmaras havia quatro cursos em desativação, respectivamente.
Sabemos que os números hoje, em 2024, já não são os mesmos, e aventa-se que a área Interdisciplinar possua atualmente cerca de 400 PPGs que se estruturam nas quatro câmaras como sinalizado anteriormente. Tal interesse de programas diversos das três grandes áreas em que se estrutura a CAPES, demonstra claramente a existência, por assim dizer, de uma “demanda reprimida” em diversos segmentos da vida universitária brasileira, por uma abordagem diferente, mais integrada e complementar, das diversas áreas da realidade, natural e social, com a qual trabalham, e resultou na criação acelerada de um grande número de PPGs focados na abordagem interdisciplinar, visto que área interdisciplinar congrega quase o dobro de programas que outras áreas mais robustas que não chegam a 200 programas.
Apesar desses dados, grande parte dos processos seletivos e concursos para ocupar vagas de professores Brasil afora não aceitam/reconhecem diplomas oriundos de PPGs interdisciplinares, constituindo um obstáculo difícil de ser superado por aqueles profissionais egressos desses programas.
Dessa forma, parece-nos que a Revista da ANINTER-SH, pode suprir um importante espaço para a discussão deste e outros aspectos da teoria e da prática da interdisciplinaridade, junto com outros periódicos já existentes na área, além, claro, de outros temas relevantes, do ponto de vista social, político e cultural para a compreensão da realidade brasileira em seus variados aspectos e interconexões com os campos das políticas públicas, da educação, da ciência, da saúde coletiva, tecnologia e inovação.
Neste número inaugural contamos com a contribuição de distintos autores cujos artigos relacionamos abaixo e que expressam um pouco da interdisciplinaridade e da diversidade regional das pesquisas no Brasil: são artigos de autoras e autores que atuam em Alagoas, Bahia, Sergipe e Pernambuco (Nordeste), Amazonas, Pará, Rondônia e Tocantins (Norte), assim como Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo (Sudeste).
No primeiro deles, “UM MUNDO MELHOR PARA UM NÚMERO MAIOR DE PESSOAS”, Djalma Thürler, Professor do PPG Multidisciplinar em Cultura e Sociedade e do PPG em Artes Cênicas, UFBA, e atualmente coordenador da Câmara II na Área Interdisciplinar da CAPES, aborda o tema da inclusão social e da redução das desigualdades sociais, cujos marcadores, no caso brasileiro, são profundamente injustos com os mais diversos segmentos sociais.
O segundo artigo, “REFERÊNCIAS CULTURAIS AFRO-BRASILEIRAS: QUESTÕES PARA ESTUDOS SOBRE PRESERVAÇÃO CULTURAL”, de Otair Fernandes de Oliveira, Professor do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Patrimônio, Cultura e Sociedade da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro - PPGPaCS/UFRRJ, destaca a importância de se incorporar as referências das diversas tradições culturais oriundas das matrizes africanas que são fonte fundamental da cultura brasileira, embora, com frequência, silenciadas ou negligenciadas pelas políticas públicas voltadas para a preservação cultural no país, acompanhando ou expressando as dificuldades produzidas pelo racismo estrutural brasileiro.
O terceiro artigo, “INVENTANDO SELFS: O ÍNTIMO E O POLÍTICO DA CULTURA CIBERFEMINISTA”, do Professor Carlos Henrique Medeiros de Souza, Professor Associado da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro e Coordenador da Pós-graduação em Cognição e Linguagem PGCL/UENF, em conjunto com Paolla dos Santos Souza e Ieda Tinoco Boechat, ambas Doutoras em Cognição e Linguagem pelo PGCL/UENF, aborda uma questão cada vez mais relevante, a atividade do movimento feminista nas redes sociais, em defesa dos direitos das mulheres e na luta pela igualdade de gênero na sociedade brasileira, na qual, segundo os dados recentemente publicados pelo Censo de 2022, do IBGE, 54% da população é composta por mulheres, demonstrando a enorme relevância da questão.
No artigo BIOPODER, ALGORITMOS E CONTROLE DA MULTIPLICIDADE, Paulline Ribeiro Barros e Elton Barros Xavier, respectivamente Mestra e Professor do PPG em Desenvolvimento Social da Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES, trazem a discussão sobre como as redes sociais, em razão das características que definem seu funcionamento por meio do uso de algoritmos e da personalização de conteúdo, além do direcionamento para consumo de bens e serviços, favorece uma percepção enviesada sobre os fatos, as informações. A partir da categoria de biopoder os autores verificam se as redes sociais - enquanto expressão das relações sociais – são utilizadas como instrumento de reprodução das tecnologias de biopolítica contra sujeitos ou grupos que são observados como risco à manutenção do controle da população.
Em BACURAU E O “MUSEU VIVO”: ESPAÇO DE MEMÓRIA E RESISTÊNCIA, Luciana Santana Diniz Mestra em Cinema e Hamilcar Silveira Dantas Junior, Professor do PPG em Cinema da UFS, analisam o Museu Histórico de Bacurau (MHB), sua importância para os moradores do pequeno povoado e espaço de resistência, luta e sobrevivência através de seus artefatos de memória, a partir da análise fílmica de Aumont e Marie para compreender melhor o dito e não dito no longa “Bacurau” e proporcionar a interpretação da linguagem cinematográfica da obra que se trata de uma luta presente, mas com elementos do passado, especialmente durante a luta no Museu Histórico de Bacurau.
Rafael Ademir Oliveira de Andrade, Doutor em Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente pela Universidade Federal de Rondônia, Professor da Faculdade São Lucas, Porto Velho – RO, traz em seu artigo IMPACTOS DECORRENTES DE UHES EM POVOS INDÍGENAS: UMA APROXIMAÇÃO TEÓRICO-METODOLÓGICA A PARTIR DOS DETERMINANTES SOCIAIS DE SAÚDE (DSS), analisa os impactos sociais em povos indígenas decorrente de empreendimentos como de hidrelétricas nos povos indígenas no norte do Brasil, a partir do conceito de Determinantes Sociais de Saúde (DSS). Rafael Andrade apresenta em seu texto como a interconexão de diversos atores em diferentes escalas e a intencionalidade de modificar os impactos destes projetos na saúde dos sujeitos e coletividades passa também pela reorganização e resistência em diferentes escalas nas comunidades indígenas.
O sétimo artigo, O DIREITO DAS PESSOAS TRANS AO TRATAMENTO HORMONAL, dos Professores Vivianny Galvão e Vinicius Minatel, ambos do Programa de Pós-Graduação em Sociedade, Tecnologias e Políticas Públicas do Centro Universitário de Maceió (UNIMA/AFYA), e de Caio Lorena de Menezes Dores, Discente da graduação em Direito do Centro Universitário de Maceió (UNIMA/AFYA), também trata de um tema cada vez mais relevante na atualidade brasileira, na qual as questões relacionadas à definição das identidades sócio-sexuais e, com ela, as dificuldades vivenciadas por várias pessoas ligadas a esta problemática, são tema central não somente na área da saúde pessoal, mas também no âmbito político e cultural em razão do conservadorismo afluente no Brasil dos últimos anos. A questão envolve os direitos humanos deste grupo social e os compromissos do Estado brasileiro com a defesa da cidadania e da Constituição de 1988, entre outros elementos importantes.
No artigo O PERFIL EPIDEMIOLÓGICO DE SÍFILIS GESTACIONAL NO MUNICÍPIO DE ARAGUATINS NO PERÍODO DE 2015 A 2021, Victor Martins Eleres, Graduado em Enfermagem pela Universidade Estadual do Tocantins-UNITINS e Lílian Natália Ferreira de Lima, Doutora em Biologia de Agentes Infecciosos e parasitários na Universidade Federal do Pará – UFPA, descrevem as características sociodemográficas, clínico-laboratoriais e tratamentos da sífilis gestacional em Araguatins, Tocantins, entre 2015 e 2021, e analisam a qualidade da assistência durante o pré-natal e o parto oferecido pelos serviços de saúde locais. O estudo apresenta as possíveis falhas na vigilância durante o pré-natal e parto, além do uso inadequado das medidas de controle recomendadas pelo Ministério da Saúde.
O nono artigo da primeira edição da Revista da ANINTER-SH, Caio de Sousa Murta, Gustavo Rovetta Pereira e André Rodrigo Rech, respectivamente mestrando, pós-doutorando e professor do PPG em Estudos Rurais (PPGER-UFVJM) trazem no texto INTERSECÇÕES HUMANIDADE-NATUREZA A PARTIR DA PERCEPÇÃO AMBIENTAL MEDIADA PELA APICULTURA E O CUIDADO COM AS ABELHAS, uma discussão interdisciplinar na qual buscam compreender as diferentes formas através das quais a criação de abelhas se relaciona com as maneiras das populações humanas perceberem e compreenderem o ambiente, identificando como a apicultura pode ser parte de uma estratégia de mudança voltada ao bem comum, mas que não acontece por si só, não é intrinsecamente sustentável e requer conhecimento, planejamento e investimento para cumprir seu papel.
O artigo AVALIAÇÃO MICROBIOLÓGICA DA QUALIDADE DA ÁGUA EM UMA COMUNIDADE DO MUNICÍPIO DE MANACAPURU de autoria de Nadielle Castro Pereira, Doutora em Imunologia Básica e Aplicada, Ronaldo Laércio de Oliveira Azevedo Filho, Lúcia Tatiana Filgueiras de Souza, Marlene Duarte de Oliveira Gadelha discentes de Medicina da Afya Faculdade de Ciências Médicas de Manacapuru, com Anna Karine Braga dos Santos, do Programa Nacional de Vigilância da Qualidade da Água para Consumo Humano – VIGIAGUA, analisam como a ingestão de água contaminada em poços artesianos em comunidades rurais torna-se um problema de saúde pública e apresentam os resultados de intervenções realizadas na comunidade e em parceria com gestores públicos locais, demonstrando como a pesquisa e a extensão permitem mudanças simples com impactos práticos na vida e na saúde de comunidades rurais.
Por último, o artigo A CRIMINALIDADE E AS NOVAS TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO de autoria de Lidiane Medeiros de Souza, da Faculdade Metropolitana São Carlos/RJ, Mariana Verinesi Vieira Medeiros e Fábio Machado de Oliveira, ambos do Programa de Pós-Graduação em Segurança Pública, Universidade de Vila Velha, exploram os tipos de crimes virtuais, o avanço destes no Brasil, e as leis específicas criadas para solucionar e defender os direitos das vítimas desses tipos de crime.
Na seção Relato de experiência trazemos o texto “FÓRUM DE PROGRAMAS INTERDISCIPLINARES DE PÓS-GRADUAÇÃO: DE ONDE VIEMOS E PARA ONDE VAMOS”. Os autores, Rafael Duarte Coelho dos Santos, PPG em Computação Aplicada no INPE e Márcia Bento Moreira, PPG em Extensão Rural da UNIVASF, analisam a criação do Fórum de PPGs da Área Interdisciplinar da CAPES, o qual tem cumprido um papel fundamental na discussão e articulação dos coordenadores dos PPGs em torno, especialmente, do tema do Relatório Sucupira, o “karma” de todos os coordenadores, que ocupa grande parte das preocupações e do tempo de professores, alunos e egressos dos PPGs em razão do impacto potencial, positivo ou negativo, que a avaliação quadrienal tem para a vida institucional e acadêmica dos programas de pós-graduação. Sendo os atuais coordenadores do Fórum, sua análise da sua trajetória e das perspectivas que se abrem para sua atuação, é de grande interesse para todos nós.
Este pequeno conjunto de artigos mostra a diversidade temática que a perspectiva interdisciplinar é capaz de estimular, e esperamos que a revista InterCursos se torne, rapidamente, um periódico valorizado por sua abertura à pluralidade da produção acadêmica e científica dos PPGs da Área Interdisciplinar da CAPES e da produção de autoras e autores cujas pesquisas interdisciplinares possam contribuir para compreensão de fenômenos sociais.
Seja bem-vinda, seja bem-vindo.
Boa leitura!!
Napoleão Miranda, Presidente da ANINTER-SH (PPGSD/UFF)
Verônica Teixeira Marques, Vice-Presidente da ANINTER-SH e Editora-Chefe da Revista da ANNTER-SH. (SOTEPP-UNIMA/Afya).
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